De acordo com Carlo Barbieri, presidente do Oxford Group, crise atual favorece tratados bilaterais

Um economista que atua em operações de empresas entre os Estados Unidos e o Brasil alertou que os problemas com coronavírus devem redefinir os mercados entre os dois países. “Nós teremos um realinhamento na estrutura comercial do mundo, pois o mercado globalizado como o conhecemos hoje já está em plena mudança”, disse Carlo Barbieri, presidente do Oxford Group.

Segundo ele, os blocos comerciais, como a União Europeia e o Mercosul, deverão abrir lugar para acordos bilaterais entre países. “O Brasil, se aproveitar a oportunidade, poderá ser prioridade no comércio internacional com a China e os EUA”, afirmou.

A consultoria americana Oxford Group apontou que os efeitos da pandemia no mercado global deverão ser extremos e provocar profundas alterações na forma como os países negociam seus produtos e serviços. Barbieri alertou que fenômenos recentes, como a saída da Inglaterra da União Europeia e da Argentina do Mercosul, demonstram que essas mudanças seguiram seu rumo, mas de forma mais ágil consolidando uma nova era para relações comerciais entre os países.

Para ele, os problemas com o coronavírus estão acelerando essa ruptura dos blocos comerciais e abrindo espaço para uma nova dinâmica comercial pautada sobre acordos entre países. Diante disso, os acordos bilaterais serão a nova forma de globalização.

“Há um acirramento da guerra comercial entre China e Estados Unidos. A China exportava US$ 800 bilhões para os EUA anualmente e só comprava US$ 400 bilhões. Ou seja, havia um desbalanceamento grande e, por outro lado, as indústrias que estão saindo de lá buscarão países como o Brasil para ancorar sua indústria”, comentou Barbieri.

Atualmente, o Brasil é um dos principais parceiros comerciais dos EUA e da China e na visão de Barbieri essa nação poderá ter protagonismo nos dois países, caso compreenda essa nova forma de jogo de mercado. De acordo com esse economista, já nos primeiros meses da pandemia, os produtos brasileiros ocupam posição de destaque nos mercados com a China e com os EUA.

Isso ocorreu quando o Ministério da Agricultura do Brasil divulgou o aumento da exportação de carnes suína e bovina para a China. Segundo o Departamento de Alfândegas, mesmo com a pandemia as exportações de suínos cresceram. O destino foi a China, maior consumidor de carne suína do mundo.

Por outro lado, dados da Organização ComexVis colocam os principais destinos aos produtos brasileiros os Estados Unidos com 17,36% das exportações e China com 12,45%. Um protagonismo que deve aumentar, segundo avaliação do economista que tem especializações nos Estados Unidos e mapeia o comércio exterior e relações comerciais do Brasil com o mundo.

“Os Estados Unidos já estão negociando diretamente com o Japão, Rússia, Índia e com outros países, como o Brasil, assim como fizeram com a Coreia do Sul, com Filipinas com e outras nações. Essa fuga das empresas internacionais da China em busca de outro lugar para desenvolver as suas atividades e continuar provendo seus produtos no mercado americano, devem também conferir ao Brasil um papel de protagonismo comercial”, alegou Barbieri. “O que veremos, então, é um novo mercado americano mais aberto a substituir produtos que normalmente vinham da China.”

Ele também apontou que o Brasil terá uma grande possibilidade de não só exportar o que já produz como também receber tecnologia e investimento de indústrias que estão saindo da China e que estão em busca de um outro lugar para ficar.

Barbieri sinalizou que o Brasil tem parques industriais muito bem estruturados que poderão, agora, com uma política de governo mais voltada à exportação, aumentar o seu fluxo. “A peste que se abateu na produção suína na China desde o ano passado, a fez aumentar a demanda de compra a nível mundial. Então, é realmente um seguimento interessante para o Brasil entrar nesta área e a China, em particular, tem tido altos e baixos nessa produção agrícola, principalmente na área animal por conta da falta de cuidados na área de saneamento.”

Para ele, o importante é manter o custo de produção baixo, porque na medida que a China retorne a sua capacidade de produção, ela vai procurar produtos que possam manter a qualidade, mas também preços competitivos.

Barbieri também alegou que a China não tem problemas de divisas. Ele ressaltou que aquele país tem um programa de cerca de US$ 2 trilhões de reservas só em bônus no tesouro americano. “É claro que há interesse da China em continuar a sua exportação. Aquele país tem, inclusive, um projeto que chama Made in China 2025, que é o domínio do comércio mundial através de logística.” Ele lembrou que a China ampliou toda a sua capacidade de compra na área de portos e construção de ferrovias. “Ela sabe que sua demanda será crescente.”

Também foi apontado por Barbieri que o objetivo da China é o de tirar o poder do dólar no mercado mundial e colocar como alternativa a sua moeda digital, recém lançada. Logo, para comprar e vender para a China está será a nova moeda. Diante disso, a queima de estoques das reservas em títulos do tesouro americano, faz parte desta estratégia, pois espera a desvalorização do dólar.

Esse economista ainda destacou que a medida que melhora a qualidade de vida do povo chinês é que aquele país precisa de mais produtos, particularmente agrícolas. E a parte da exportação da China está mais voltada para o seguimento industrial. É onde praticamente o país ganha mais e pode pagar melhor aos seus cidadãos. “Sem dúvida o mundo inteiro vai comprar menos, não é só o Brasil que diminuiu a sua compra. A demanda de petróleo caiu a praticamente quase zero. Então, a China vai buscar um reequilíbrio, mas esse reequilíbrio não é necessariamente contra o Brasil”, disse Barbieri.

Na visão dele, o Brasil é um parceiro importantíssimo para a China, pois esse país pode tirar um grande proveito nessa ocasião, agora, em que a China continuará tendo que disputar mercado para os seus produtos, porém, está sofrendo uma série de ações, inclusive públicas, a nível da Justiça em função de ter liberado de maneira irresponsável e tardia informações do vírus o que está causando também uma crise política com o mundo inteiro.

Outra expectativa é de que ocorra uma nova relação comercial dos Estados Unidos com o Brasil diante dessa doença. Isso porque já está em curso uma negociação mais direta entre o país norte-americano e o Brasil. “Na área agrícola, em particular, com toda sua capacidade de produção de proteína animal, o Brasil deve ocupar um lugar de destaque. Isso porque a pandemia não só acabou atrapalhando a produção nos EUA, como também na China. Com isso, o país se coloca como um eminentemente provedor de produtos de alta qualidade para o mundo em geral e para esses dois grandes países, em particular”, ressaltou Barbieri.