matéria publicada originalmente pelo Jornal do Comércio

A eleição de Joe Biden, com a promessa de priorizar políticas ambientais em nível global, traz novas perspectivas para o comércio exterior do Amazonas. Aliada ao movimento gradual de mudança das indústrias estrangeiras instaladas na China, em favor de bases de produção em outros países emergentes, sinaliza oportunidades de o Estado incrementar suas exportações para os norte-americanos, em um primeiro momento, e para os europeus, mais adiante, beneficiando a ZFM e prod u t o r e s d o interior amazonense. Para isso, os governos federal, estadual e municipal devem estar aliados em torno de m u d a n ç a s estratégicas na gestão do comércio exterior, com a criação de clusters regionais. Isso não exclui, por outro lado, a possibilidade de as empresas darem um passo adiante na internacionalização, em busca de uma fatia dos US$ 100 trilhões do mercado mundial. Esta é a avaliação do presidente e CEO do Grupo Oxford USA (empresa brasileira de consultoria de gerenciamento para ingresso nos EUA), Carlos Barbieri, em entrevista exclusiva à reportagem do Jornal do Commercio. Em paralelo com a guerra comercial e a disputa geopolítica entre os EUA e a China, a pandemia levantou a questão da conveniência em torno da divisão internacional de trabalho entre os países. Especialmente quando faltaram respiradores e máscaras, entre outros itens de primeira necessidade no contexto da crise da covid-19, fabricados quase que exclusivamente no país asiático, entre outros. É uma realidade que está levando fábricas instaladas por lá buscarem novos endereços para produzir, conforme o CEO da Oxford USA. Jornalista, educador, palestrante, analista político e consultor financeiro, Barbieri lembra que, atualmente, a China exporta em torno de US$ 490 bilhões por ano para os EUA e importa pouco mais de US$ 160 bilhões. De acordo com o dirigente, há preocupação dos norte-americanos em reequilibrar essas contas, seja qual for o presidente. Em contrapartida, a mudança na agenda ambiental do governo dos EUA, já anunciada por Joe Biden, abriria novas possibilidades. “É hora de o Amazonas virar o jogo. O mundo inteiro estará falando da Amazônia, nos próximos quatro anos. É a grande oportunidade de o Estado colocar seus produtos no mercado internacional. Biden será nosso potencial relações públicas em nível mundial. Tudo que tiver o carimbo do Amazonas, sob o âmbito da preservação da floresta, terá maior sensibilidade do mercado norte-americano em particular e mundial, em geral”, declarou.

Entraves e oportunidades

Um entrave potencial para o Amazonas está no acanhado nível de exportações, que costumam ser dez vezes menores do que as importações, dada a primazia da indústria, em detrimento do agronegócio, em seu modelo de desenvolvimento. O PIM direciona de 90% a 95% de sua produção para o mercado doméstico, reservando as vendas externas para atender mercados estratégicos –especialmente os países vizinhos. As oportunidades costumam se abrir mais para itens com selo “Amazônia”, geralmente produtos primários de menor valor agregado, mas empresários locais veem dificuldades e custos adicionais em colocar seus produtos no estrangeiro. Os EUA, por outro lado, aparecem como o terceiro maior comprador (US$ 59,47 milhões) e o segundo maior fornecedor (US$ 773.90 milhões) do Amazonas, no acumulado dos dez meses iniciais de 2020. Perdeu para Venezuela e Colômbia, nas exportações (ouro, motocicletas, turborreatores e madeira, entre outros itens), e só ficou atrás da China, nas importações (óleos de petróleo, polímeros de etileno, componentes eletrônicos e platina) O presidente da Oxford USA, contudo, diz não ter dúvidas de que o Amazonas é um dos Estados brasileiros que mais tem capacidade de aumentar suas exportações de maneira exponencial, diante do novo quadro de mudança de base de compras, apostando na possibilidade de ser um fornecedor preferencial para os EUA –e também para a Europa. “Claro que temos Índia, Cingapura e outros países buscando receber essas fábricas. Mas, é uma chance para o Amazonas, o momento de promover os manufaturados da Zona Franca. Há mercado e Manaus já tem um parque industrial formado e mão de obra qualificada. A partir daí, é possível virar o ciclo de internação para o mercado interno em favor das exportações. E conseguir tarifas preferenciais para colocar o produto lá, em torno da salvaguarda de uma Amazônia já industrializada, e com os selos ‘Amazônia’ e ‘saudável’”, afiançou

Clusters e receptividade

Segundo o presidente da Oxford USA, é “uma realidade internacional” que as vendas externas são bem sucedidas, na medida em que são criados clusters em nível estadual ou municipal –ou mesmo regional –para fomentar o processo de industrialização e o comércio exterior. Ele lembra que 100% dos municípios da China têm uma secretaria para esse fim, mas o Brasil, ainda padece com “uma cultura fortemente centralizada”, que faz com que prefeituras e governos de Estado não tenham participação significativa na criação de “um processo de exportação consistente”. “O Amazonas tem riquezas naturais e potencialidades. Se nós trouxéssemos não apenas fábricas internacionais que se utilizam de franquias para prover o mercado interno, mas também desenvolvêssemos a produção local de bens em áreas como a de cosméticos e produtos naturais, com uso da biodiversidade, estaríamos agregando valor à exportação e distribuindo a riqueza entre aqueles que podem extrair insumos e produzir de forma organizada e ecologicamente correta. Poderíamos fazer disso uma marca mundial”, asseverou. No entendimento do dirigente, as “fábricas internacionais” que estão em Manaus deveriam ser gradualmente motivadas a pensar em ter mais presença no mercado mundial e não apenas se limitar ao brasileiro. Barbieri argumenta, entretanto, que o Amazonas não deve depender apenas de atuação governamental para seguir caminhando para o mercado externo, e argumenta que as empresas faça isso, de forma isolada ou conjunta. E lembra que o mercado norte-americano –cujo PIB anual é de US$ 21 trilhões –está de portas abertas para empresas estrangeiras. “Podem criar suas bases em outros países, particularmente os EUA, que são tão receptivos. Talvez até coordenem, como muitas empresas do Sul do Brasil têm feito, sua base exportadora a partir de sua internacionalização lá, onde a empresa vai encontrar uma grande força de apoio junto aos Estados, como é o caso da Flórida, ou à União. São mais de 2.000 formas que os norte-americanos têm para apoiar o ingresso de empresas estrangeiras”, concluiu.